7 de abr. de 2013

Dona Flor, Seus Dois Maridos e as Polaridades

Por: Hipátia

Olá a todos,


Gostaria de iniciar este post com um resumo do livro “Dona Flor e Seus Maridos” de Jorge Amado para colocar a todos por dentro da ideia por trás desta publicação, mesmo aqueles que não conhecem a história. Vamos lá...


Dona Flor e Seus Dois Maridos

A história se passa em Salvador, na primeira metade do século passado. Tendo este ambiente como plano de fundo, Florípedes Paiva, que é filha de uma senhora conservadora e que espera ascensão social por intermédio do casamento de suas filhas, encontra sua primeira paixão nos braços de Vadinho. Como o moço não tem posses, a mãe de Flor a proíbe de casar, porém, como estava perdidamente apaixonada, Dona Flor aceita as juras de Vadinho e os dois consomem sua paixão. Diante do ocorrido e de uma sociedade restrita, a mãe acaba, com desgosto, permitindo o casamento dos dois.

O primeiro casamento de Dona Flor se revela bem turbulento: ela ama o rapaz e está satisfeita com sua vida sexual, porém seu marido é viciado em jogados de azar; além disto, quando não está em alguma casa de jogos, está envolvido em algum caso amoroso. A vida de Dona Flor se resume a muitas preocupações entrecortadas por alguns poucos momentos de felicidade; até que Vadinho, devido a seus excessos, morre em um domingo de Carnaval.

Um ano após a morte do primeiro marido, Dona Flor acaba se casando novamente com o farmacêutico Dr. Teodoro. O segundo casamento se mostra bem sossegado: Dr. Teodoro é um homem trabalhador, carinhoso e bem disciplinado; Dona Flor se vê num casamento dos sonhos de qualquer mulher de seu tempo, porém... ela não se sente completa... ela sente falta das inconsequências de Vadinho, principalmente em sua vida íntima, já que o farmacêutico se mostra metódico até na cama.

Próximo do aniversário de morte de Vadinho, Dona Flor volta a pensar muito no primeiro marido, o que faz Vadinho voltar do “mundo dos mortos”. Ele volta exatamente igual era antes: assanhado e arrumador de confusão. Nisto, por modificar a vida de muita gente, os Orixás resolvem mandá-lo de volta, com exceção de um: Exu. Neste momento, ocorre um acontecimento que é digno de ser contado em detalhes: todos os Orixás se juntam para mandar Vadinho de volta para o outro mundo, no que Exu faz oposição; Exu defende o moço o quanto pode, mas como está sozinho, ele aos poucos vai sucumbindo à força dos demais Orixás. Quando imaginamos o fim de Vadinho, eis que Dona Flor finalmente decide que quer manter Vadinho em sua vida e, neste momento tão simbólico, Vadinho permanece neste mundo.

Na última cena do livro, nos é descrito um diálogo entre os vizinhos de Dona Flor, que a veem caminhando toda feliz ao lado de Dr. Teodoro; todos os senhores da conversa concluem que uma mulher só poderia andar tão alegre como se encontrava Dona Flor, se tivesse um marido que fosse bom homem, tanto na mesa quanto na cama. Entretanto, o que eles não conseguem enxergar é que, junto com Dona Flor e Dr. Teodoro, também caminha um Vadinho todo serelepe.


A Dualidade da Vida

Agora, os leitoros podem estar se perguntando os motivos que me levaram a apresentar o resumo de um livro literário em um blog como este e minha ‘resposta’ é: como andamos tratando a dualidade em nosso dia a dia?

Primeiramente, eu gostaria de trazer um breve conceito sobre Yin e Yang. Nas tradições orientais é dito que no princípio havia uma única força que, a posteriori, dividiu-se em duas energias. Uma delas compreende tudo que está em expansão, tudo que age e está em ação e como o calor, o fogo, a luz. Esta energia recebe o nome de Yang. A segunda, compreende tudo que está se contraindo, que está congelando, que está em introspecção; pode-se exemplificar o frio, o gelo, as trevas.


A partir destes breves conceitos, eu gostaria de propor uma reflexão sobre como esta dualidade está presente ao nosso redor: dia x noite, direita x esquerda, masculino x feminino, vida x morte, em cima x embaixo, claro x escuro, movimento x repouso... Aparentemente, somos rodeados pela polaridade! Obviamente, poderíamos pegar cada uma dessas partes e subdividi-las em outras tantas porções, entretanto, eu proponho que fiquemos nesta divisão básica.

Agora que tal procurarmos esta dualidade dentro de nós? Vamos lá: mental x corporal, feminino x masculino (“Ah não! Eu sou muito macho e não tenho nada de feminino em mim!”), razão x emoção (“Ah não! Sou totalmente racional; as emoções não tem vez na minha vida”), necessidades espirituais x necessidades físicas (“Ah não! Eu quero transcender a ‘carne’, por isso não dou ouvido a meus extintos”)...

Bem, quando refletimos sobre a dualidade presente em nós, muitas vezes, deparamos com a transformação de um dos lados em algo negativo/ruim (por vários motivos históricos e culturais que não pretendo discutir nesta coluna), normalmente do polo negativo (representado pelo Yin) e que é tratado por muitas pessoas como algo ruim e que deve ser evitado, e eu pergunto @ leitor@: será mesmo que tem que ser assim?

Vamos imaginar algumas situações: 1) Uma pessoa está doente – é melhor que haja a expansão (Yang) ou contração (Yin) da doença? 2) Uma pessoa é totalmente racional – o que acontecerá quando ela for lidar com os outros e suas emoções/necessidades (algumas teorias argumentam que os autistas teriam cérebros super racionais/sistematizadores)? E para finalizar, um exemplo bem bobo (rss) – 3) sua namorada está na TPM (vish!), é melhor você tratá-la com o seu lado mais masculino e racional ou é melhor trazer um lado mais feminino e sensível à tona ao tratar com ela (se duvidam, façam o teste rss)? 

Aprendendo com Dona Flor

Vou confessar o que me chamou a atenção nesta obra de Jorge Amado: Dona Flor visivelmente vive pulando de um extremo a outro da vida com cada marido e fica bem claro seu incômodo: ela sente que está faltando algo. Essa ‘guerra’ da personagem com suas polaridades fica transparente na disputa entre Exu (trabalhador da Esquerda e que, na obra, é tratado como um Orixá) e os demais Orixás, que dura até o momento em que Dona Flor resolve aceitar seus dois lados (a mulher respeitosa e íntegra e a mulher com necessidades e desejos físicos), que é representado metaforicamente pela aceitação dos dois maridos em sua vida. O livro termina mostrando uma Dona Flor visivelmente feliz e finalmente completa.


Termino a coluna perguntando: como você anda tratando a sua dualidade no seu dia a dia?...... E que história é essa de Exu e Esquerda?... Cenas para os próximos capítulos :-)

Ótima semana a todos!


Referência:
- AMADO, J. Dona Flor e Seus Dois Maridos: História moral e de amor. São Paulo: Companhia das Letras, 2008.


Dicas de leitura:
- O Grande Computador Celeste - parte II

- Leis Herméticas

3 comentários:

  1. Seu texto éinteressante, mas acho que somos muito mais múltiplos do que 2; você mesmo citou isso. A polaridade é construída no discurso, no contexto social, histórico e momentâneo. Acharia mais válido focar na multiplicidade e evitar a simples contraposição de opostos, mesmo que algumas vezes isso possa parecer interessante num primeiro momento.

    Perceba que, mesmo no seu relato, eram vários orixás. A dualidade é situacional, apenas pela oposição declarada de Exu frente a um contexto específico e uma decisão conjunta dos demais. A dualidade se instala nesse ponto e vai se desfazer logo em seguida, apresentando um novo infinito de possibilidades. Acho que o importante é saber que, ao escapar da dualidade, multiplicidades novamente se apresentarão em nossas vidas.

    Mas esse é só meu ponto nesse contexto. Você tem o seu. E ainda existem vários ;-)

    ResponderExcluir
    Respostas
    1. Bom, eu acho que na verdade o seu comentário complementa o texto. Uma escala é só o nível de manifestação e mistura entre os pólos opostos, isso sim gera um grande âmbito para a nossa vida. Se for pegar os Orixás para dar o exemplo, as 7 linhas (Cores) são resultadas da divisão do branco (Oxalá), já o Orixá Exu, representado pelo preto nesse mistério, trabalha sempre em oposição, mas ambos polos trabalham juntos pela evolução; aquela velha história que se Oxalá está dentro de algum lugar, Exu precisa estar fora, e vice-versa. É só uma maneira de representar/ressaltar que até mesmo dentro do mesmo objetivo é importante a identificação de pólos.
      No livro O Caibalion diz: "Tudo é Duplo; tudo tem pólos; tudo tem o seu oposto;o igual e o desigual são a mesma coisa; os opostos são idênticos em natureza, MAS DIFERENTES EM GRAU; os extremos se tocam; todas as verdades são meias verdades; todos os paradoxos podem ser reconciliados."
      A identificação dos polos, na minha opinião e na da maioria dos outros hermetistas (muita gente esquece que o Egito fica na África...), é só o início de uma boa organização de sistemas, os graus e escalas surgem de uma posterior divisão deles.
      Obrigado por comentar :)

      Excluir
  2. Concordo com você sobre a multiplicidade, mas preferi trabalhar basicamente com a dualidade, para, primeiramente, trazer o conceito da dualidade do Yin e do Yang e tentar levar o(a) leitor(a) a procurar estes conceitos no seu dia a dia e parar para pensar como ele(a) está lidando com eles e, em segundo lugar, para linkar com um futuro post que pretendo fazer sobre o significado de Esquerda e Direita na Umbanda e quem (Orixás/Entidades) lida com o que.

    Como inicio minha participação agora, pretendo trabalhar com conceitos básicos, mas acredito que sua colocação é algo a ser levada em questão em posts futuros.

    Obrigada pelo comentário

    ResponderExcluir